A UFMG recebeu, na última semana, doação de 666 obras sobre a África, em áreas como história, economia, política, antropologia, geografia, cinema e literatura. Os livros têm origem no extinto Instituto de Investigações Científicas Tropicais (IICT), de Portugal, e passam a integrar as Coleções Especiais da Biblioteca Universitária.
A grande maioria dos livros recém-chegados é escrita em português, mas há volumes em outros idiomas. O material inclui, ainda, fontes primárias para História da África, como correspondências e outros documentos do século 15 ao 18, referentes à administração portuguesa dos territórios da costa ocidental africana.
A doação amplia a coleção sobre a África na UFMG, iniciada pelo Centro de Estudos Africanos. O acervo passa a contar com cerca de 1.300 volumes, boa parte deles adquirida nos últimos anos de editoras de Moçambique e Angola. Os livros podem ser consultados em sala do 4º andar da Biblioteca Central, no campus Pampulha.
Em tese pioneira, professor da EBA aborda a relação entre moda e modernidade com base nas ideias de aparência e de gosto
“É possível
pensar sobre a moda?” Esse foi o questionamento que motivou o
professor Tarcisio D’Almeida, do curso de Design de Moda da Escola de
Belas Artes, a empreender sua pesquisa de doutorado, defendida no fim do
ano passado na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da
USP. Em As roupas e o tempo: uma filosofia da moda, o professor
explora reflexões suscitadas pela moda e traça um histórico do que foi
produzido por pensadores acerca do tema, ao longo dos séculos.
Sob orientação da filósofa Olgária Matos, Tarcisio guiou-se
pela ideia que associa moda à produção estética e visitou as obras de
filósofos como Montaigne, Montesquieu, Rousseau, Kant e Hegel para
perceber como surgiu a relação da moda e da pulsão pelo vestuário com as
noções de futilidade, efemeridade e frivolidade. O autor se aproxima
também do pensamento de intelectuais como Walter Benjamin e Theodor
Adorno para abordar a relação simbiótica entre a moda e a modernidade
com base nas noções de aparência e de gosto.
“Ao nascer, a moda já preconiza a sua própria morte, por isso o eixo
condutor da tese foi o tempo. O objetivo foi perceber como o homem, na
evolução dos séculos, comportou-se em relação às roupas e à moda”,
explica o professor. Ao alcançar os períodos da modernidade e da
contemporaneidade, Tarcisio dedica-se à relação da moda com a cultura e
com o consumo, apoiado em nomes como Lipovetsky e Baudrillard.
Leis suntuárias Na tese, o professor trata a filosofia da moda entre os conceitos de literatura, arte, estética e fetichização de mercadorias sob perspectivas benjaminiana e frankfurtiana. Tarcisio relembra a criação das leis suntuárias, vigentes na Europa durante a Idade Média e no começo da Idade Moderna, para ilustrar como a pulsão pelo vestuário marca as sociedades há séculos. “Montaigne e Montesquieu produziram reflexões sobre as leis suntuárias, criadas para impedir a burguesia de copiar a estética indumentária da nobreza. Foi uma reação às primeiras tentativas de pessoas de classes inferiores se aproximarem esteticamente das classes superiores. A partir daí, as ideias de frivolidade e futilidade passaram a ser comumente associadas à moda”, diz Tarcisio.
Na conclusão do trabalho, o pesquisador aborda a aculturalidade da
moda, que, por vezes, tira partido de apropriações indevidas, esvaziando
patrimônios culturais de seu valor original. Como exemplo, ele cita a
controvérsia em que a grife francesa Dior se envolveu, em 2017, ao
copiar um colete bordado por artesãs romenas no distrito de Bihor – sem
dar crédito nem remunerar a comunidade local – e comercializá-lo por 30
mil euros. Em resposta, as artesãs criaram a marca Bihor Couture, que
brinca com o nome da grife e dá destaque ao artesanato romeno.
Essa história, segundo Tarcisio, mostra os limites entre o que a moda
produz como cultura e a forma como ela se aproxima do acultural ao
apropriar-se das raízes de um povo com finalidade comercial: “É possível
pensar a moda contemporânea como um acontecimento que, por meio de
práticas abusivas do mercado orientado pelo neoliberalismo econômico,
‘obriga’ o criador a oscilar entre a adequação do processo criativo em
busca de traços culturais e o alinhamento à demanda exorbitante do
mercado.”
Pioneirismo A tese defendida por Tarcisio
D’Almeida é um marco na pós-graduação em Filosofia na USP, pois foi a
primeira que tem a moda como tema. O pioneirismo também
marcou sua dissertação de mestrado, Das passarelas às páginas: um olhar
sobre o jornalismo de moda, defendida em 2006, no Programa de
Pós-graduação em Ciências da Comunicação da USP. Foi a primeira
desenvolvida na universidade paulista sobre jornalismo de moda.
A tese do professor mantém estreita relação com o livro Moda em
diálogos: entrevistas com pensadores, publicado em 2012. A obra é
resultado de projeto desenvolvido desde a década de 1990 pelo
pesquisador, que dialoga com referências contemporâneas sobre a moda
como objeto de reflexão.
Tese da Belas Artes mapeia e analisa o filme de estrada latino-americano contemporâneo
Itamar Rigueira Jr.
Por definição, uma viagem tem começo, meio e fim. Inclui a preparação e a partida, os acontecimentos do percurso e a chegada. Não necessariamente, essa rota se aplica ao cinema e, particularmente, aos filmes de estrada latino-americanos contemporâneos. Nessas produções, os personagens continuam suas viagens mesmo depois do “fim”. Não importa se atingiram seus objetivos ou se falharam.
Essa é uma das características encontradas nos filmes de estrada – nove obras de seis países da região, produzidas entre 1990 e 2010 – analisados pela jornalista e pesquisadora Mariana Mól Gonçalves, que defendeu tese na Escola de Belas Artes. Ela deparou com “sujeitos de suas próprias trajetórias”, pessoas de carne e osso, envolvidas em tramas simples, mas de alcance profundo.
Mariana Mól se debruçou sobre filmes de Brasil, Argentina, México, Uruguai, Equador e Cuba, além de Diários de motocicleta, de Walter Salles, produção que a autora do trabalho classifica de “pan-americana”. Depois de uma revisão bibliográfica em que reconhece a influência doroad movie consagrado nos Estados Unidos e de destrinchar as características históricas do cinema na América Latina, a pesquisadora dividiu os filmes de seu corpus em três grupos, de acordo com suas características mais fortes.
Motivação mínima
O primeiro bloco se destaca pelos “relatos mínimos”: questões humanas tratadas de forma singela em encontros e desencontros que seguem a lógica do tempo da viagem. “Esses deslocamentos não têm um objetivo grandioso, a motivação pode ser a vontade de seis amigos de ver o mar pela primeira vez”, exemplifica Mariana, referindo-se a El viaje hacia el mar, de Guillermo Casanova (Uru/Arg, 2003). Segundo ela, esse grupo apresenta uma característica comum a todos os filmes estudados, que é a produção enxuta, com aproveitamento máximo de recursos. Viajo porque preciso, volto porque te amo, de Marcelo Gomes e Karim Aïnouz (Bra, 2009), e Histórias mínimas, de Carlos Sorín (Arg/Esp, 2002), completam o bloco.
Se o road movie clássico é feito de carro ou moto, por uma ou duas pessoas, nos longas analisados as viagens envolvem muitas vezes mais gente, e os meios de transporte são variados – bicicleta, ônibus, caminhão, e há também quem vá a pé ou de carona. Família rodante, de Pablo Trapero (Arg/Bra/Esp, 2004), reúne 12 parentes em uma casa sobre rodas e expõe questões de gênero e geracionais. “O segundo bloco agrupa filmes com relações familiares mais intrincadas, também pautadas pela coprodução. Tendo mulheres como protagonistas, essas produções exploram com mais intensidade trilhas sonoras identificadas com o país onde a trama se passa”, explica Mariana Mól. O grupo é composto ainda de Guantanamera, de Tomás Gutiérrez Alea e Juan Carlos Tabío (Cub/Esp/Ale, 1995), e E sua mãe também, de Alfonso Cuarón (Méx, 2001).
Os três últimos filmes explorados por Mariana Mól simbolizam com mais intensidade um tipo de produção carregado de realidade. A pesquisadora lembra que o cinema latino-americano é herdeiro do Neorrealismo italiano, que mostrou a Europa destruída do pós-guerra, filmada do lado de fora. “Os cineastas daqui usam o espaço físico como elemento de realidade. E o realismo do conteúdo contagia a forma, ou seja, o modo de produção, baseado muitas vezes, por exemplo, no registro que mistura o documental e o ficcional”, ela comenta. Esse bloco é formado por Cinema, aspirina e urubus, de Marcelo Gomes (Bra, 2005), Que tán lejos, de Tania Hermida (Equ, 2006), e Diários de motocicleta (vários, 2004).
A obra de Walter Salles, que levou para as telas a viagem do jovem Ernesto Guevara com seu amigo Alberto Granado, sintetiza, de acordo com a pesquisadora, o perfil do filme de estrada latino-americano contemporâneo. “Sob o impacto de paisagens grandiosas, dois jovens entram em contato com índios, agricultores e outros explorados, e, por meio da viagem, tomam consciência da realidade. O filme mostra que toda viagem é transformadora”, afirma Mariana Mól.
Tese:Filmes de estradae América Latina: caminhos de uma estética e narrativa própria
De Mariana Mól Gonçalves Orientadora: Ana Lúcia Andrade
Defendida em agosto de 2014, no Programa de Pós-graduação em Artes da Escola de Belas Artes