Assim como Janis Joplin, Jim Morrison, Kurt Cobain e Jimmy Hendrix, o talento de Amy Winehouse ultrapassa as regras de gravadora e mercado. Ela era o que a sua essência constituiu como um ser criativo e avesso às regras
Publicado no Jornal OTEMPO em 31/07/2011
TARCÍSIO D´ALMEIDA
O mundo da música está de luto. Mas, também, o da moda está. A fatídica morte, também aos 27 anos, da cantora britânica Amy Winehouse, no dia 23 de julho último, em Londres, posicionou-a no time dos bons intérpretes que traduzem os anseios e desejos de uma geração. Assim como Janis Joplin, Jim Morrison, Kurt Cobain e Jimmy Hendrix, o talento de Amy Winehouse ultrapassa as regras de gravadora e mercado. Ela era o que a sua essência constituiu como um ser criativo e avesso às regras. Mais valia o alternativo do que o mainstream para ela. Por isso mesmo, podemos considerar seu estilo extremamente marcante não somente para o universo da música, mas também para o da moda; estabelecendo sinergias entre música e moda. Aliás, em uma era em que o conceito de tendência anda esvaziado e pulverizado, encontramos em Amy a força e a importância da presença do estilo; sim, este que é único, que se constitui como uma marca, uma assinatura individual de cada um de nós numa era de sociedade globalizada e sem fronteiras.
O que nos faz pensar que o estilo de Amy vai além de uma moda específica? Uma possível resposta talvez esteja na plena consciência de seu estilo e como ele se confirmou em suas idealizações constitutivas de sua imagética e veia artística. Sim, pois em Amy havia a mescla dos tempos: a vontade nostálgica, mas muito bem dosada e costurada, com o despojado do viver contemporâneo. A construção da imagem da estrela Amy existe fundamentada em dois princípios-características essenciais: a beleza e a moda, ambas demarcadas pelas atitudes retrôs e que estão intimamente relacionadas às releituras pela moda atualmente. Para a primeira, ela resgatou a presença constante do delineador nos olhos e a estrutura do cabelo colmeia; já para a moda, podemos confirmar em Amy o desejo do retorno à silhueta dos looks comportados das décadas de 1950 e 60, mas com outra leitura, e que dialogavam com as tatuagens da artista.
Ela não seguiu nenhuma tendência. Pelo contrário, o seu estilo virou tendência em jovens de todo o planeta. Criou-se, portanto, a estética do jeito de cantar e se vestir à la Amy, que abriu caminho, direta ou indiretamente, para outras artistas, tais como Duffy e Adele. Assim como Amy, elas adotaram como fonte de inspiração em seus visuais as belezas dos 50 e 60 nas construções de seus estilos. Esse mergulho no passado é também presente na musicalidade da artista, que mesclou jazz e ‘neo-soul’ com rock. O que a distancia, por exemplo, das concepções musicais de Madonna, Björk, Lady Gaga e Rihanna, outras artistas da música que são também ícones da moda. Talvez, o mais apropriado seria pensarmos em Amy como um autêntico ícone de estilo. A partir daí, poderíamos compreendê-la também como um ícone da moda.
Mas, assim como Madonna, Victoria Beckham e Kate Moss, Amy Winehouse também teve suas incursões mais diretas com a moda. Criou uma linha para a marca do clássico streetwear britânico Fred Perry. Colaborou com duas coleções, a última delas para a primavera/verão 2011, e desenvolveu mais três, as quais deverão ser lançadas postumamente. O fundamento central é a inclinação pelo retrô, que pautava o olhar e o cuidado da artista com as criações.
Mas a sinergia entre estilo e moda ocorreu naturalmente, com influências em coleções, em editoriais e campanhas de moda em revistas como a “Vogue Paris”, de fevereiro de 2008, que dedicou um editorial, clicado por Peter Lindbergue, com a modelo brasileira Isabeli Fontana produzida como Amy Winehouse. Outro exemplo da forte marca e influência de Amy na moda aconteceu com a campanha da coleção de joias da Chanel, no mesmo ano, que teve a top Coco Rocha em looks sóbrios da Chanel, mas com o forte apelo das joias e da atitude da artista, via a concepção de beleza da campanha. Este mesmo conceito de beleza com a maquiagem e cabelos à la Amy inspiraram o desfile de dezembro de 2007 da Chanel.
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Tarcisio D’Almeida é professor e pesquisador do curso Design de Moda da Escola de Belas Artes, da Universidade Federal de Minas Gerais (EBA-UFMG). Email: tarcisiodalmeida@eba.ufmg.br. Ele divide este espaço com Susanna Kahls e Jack Bianchi.
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